Não dará o seu tempo por perdido se ler a entrevista RIL de hoje com João Pedro Vala, autor do muito elogiado Dicionário de Proust (Quetzal).
Todas as entrevistas estão acessíveis a partir daqui.
Amanhã: Gabriela Ruivo.
Terça-feira: Richard Zimler.
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Se pudesse escolher uma ou duas pessoas para lerem o seu livro mais recente, quem seriam?
Normalmente, aspiro a que os meus livros sejam lidos pelas pessoas mais radicalmente diferentes de mim. No entanto, dadas as características específicas do meu livro mais recente, o Dicionário de Proust, e uma vez que entendo os estudos literários como uma conversa que tem como fim último desvendar as verdades (seja lá o que isso for) que se escondem dentro de um texto, diria que os meus leitores ideais seriam Proust e os críticos de quem mais discordo.

Como lida com o bloqueio criativo?
Talvez erradamente, estou convencido de que a criatividade e inspiração desempenham um papel bem mais pequeno do que se apregoa no processo de escrita de um livro. No meu caso, a construção de um livro tem vários processos que vão decorrendo mais ou menos em simultâneo: a maturação, a escrita e a rescrita. Só este último requer inspiração e criatividade, no sentido que normalmente damos a esses termos. Se a inspiração não vier, sobra sempre muito para fazer.
Qual foi o melhor ou o pior conselho de escrita que já recebeu?
Acho que uma das lições mais importantes que aprendi ao longo do interminável processo de me tornar escritor foi-me ensinada pela experiência: a escrita é um caminho que só podemos aprender através da construção de uma relação com a nossa interioridade. Por isso, todos os conselhos sobre métodos, lugares e períodos de escrita são supérfluos. Aprendi também, e não posso sublinhar excessivamente a importância disto, a pedir e aceitar conselhos do menor número possível de pessoas.
Quem é a pessoa, ou qual é o lugar ou prática que teve o maior impacto na sua formação como escritor?
O Simão Lucas Pires, que desde adolescente tem uma vocação inequívoca e arrebatadora para a literatura, vocação essa que me inspirou e procurei descaradamente imitar. Além disso, levava para a escola livros do irmão, Jacinto, que depois me emprestava.
Há alguma parte da sua rotina de escrita que poderia surpreender os seus leitores?
A parte mais importante da escrita é a leitura. Para evitar perder demasiado tempo a escolher o livro seguinte e para garantir a diversidade das minhas leituras, vou ao site randomnumbergenerator.com para escolher aleatoriamente o livro que lerei a seguir.
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João Pedro Vala nasceu em Lisboa, em 1990. É licenciado em Gestão e doutorado em Teoria da Literatura pela Universidade de Lisboa, com uma tese sobre Marcel Proust na Universidade de Chicago. Grande Turismo (2022), finalista do Prémio Fundação Eça de Queirós, é o seu romance de estreia, a que se seguiu Campo Pequeno. Foi o primeiro distinguido, em 2025, com o Prémio Wook, por esse último romance. (via Wook)
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