REVISTA DE IMPRENSA LITERÁRIA publica hoje mais uma entrevista. Desta vez, Joana Bértholo. É a oitava de uma série dedicada a autores portugueses (todas as entrevistas podem ser lidas aqui).
Amanhã: Gonçalo Câmara.
Terça-feira: Margarida Rebelo Pinto.

Se pudesse escolher uma ou duas pessoas para lerem o seu livro mais recente, quem seriam?
O meu livro mais recente é «Augusta B. — ou as Jovens Instruídas 80 Anos Depois» que retrata uma tentativa de publicar hoje o célebre anúncio que Agustina Bessa-Luís publicou em 1944 n’O Primeiro de Janeiro. Tenho gostado muito da forma como este livro tem sido lido pelos jovens daquela faixa etária. Agustina tinha 22 anos quando publicou o anúncio, e também Augusta e Raquel, as personagens do livro, têm essa idade. Por isso, acho que se tivesse de escolher, convocaria mais leitores dessas idades, o início dos vintes, por serem quem me tem trazido leituras mais surpreendentes e entusiasmantes desta novela.

Como lida com o bloqueio criativo?
Se não for grave, se for só um mau dia, vou ver um filme, ler um livro, correr ou dar um mergulho no mar. Posso ter de esperar um par de dias até passar a neblina, e não insisto. Se perdurar, então sim. O que faço é começar a escrever outras coisas. Troco de texto até esse bloquear. Normalmente quando o segundo bloqueia, desbloqueia o primeiro.
Qual foi o melhor ou o pior conselho de escrita que já recebeu?
O conselho que me foi mais útil, o que reproduzo mais vezes, e pelo qual tenho mais apreço, é sem dúvida aquele que diz que a melhor forma de melhorar a escrita é “ler, ler, ler”. O pior, ou aquele que tem menos a ver comigo e com a minha escrita, é o que diz “escreve sobre o que conheces bem”. Nunca soube o que fazer com essa ideia. Motiva-me muito mais escrever sobre o que não entendo, o que me é misterioso, o que conheço mal.
Quem é a pessoa, ou qual é o lugar ou prática que teve o maior impacto na sua formação como escritor?
A Faculdade de Belas-Artes de Lisboa. Não enquanto curso ou currículo; muito mais pelo que se passava nos corredores, nos intervalos. Coincidi com uma geração de colegas e professores muito envolvidos com a vida lectiva, com o cinema, com os livros, com o mundo. Aquelas conversas abriram imenso os meus horizontes. Viajar foi igualmente importante. Ir o mais possível para longe de mim e das minhas certezas.
Há alguma parte da sua rotina de escrita que poderia surpreender os seus leitores?
O facto de escrever mesmo muito pouco a cada dia, de ser lenta, e de avançar sempre a custo. Sinto por vezes que as pessoas guardam de mim uma ideia de alguém muito mais prolífico e prolixo do que o que realmente sou.
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Joana Bértholo. Escritora e dramaturga, nasceu em Lisboa, em 1982. Licenciada em Design de Comunicação na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa e Doutorada em Estudos Culturais pela European University Viadrina, na Alemanha. Publicou na Editorial Caminho vários romances, livros de contos e literatura infantil. «Ecologia», o seu último romance, foi semifinalista do Prémio Oceanos 2019, finalista do Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, finalista do Grande Prémio de Literatura DST e nomeado para o Grande Prémio Adamastor de Literatura Fantástica Portuguesa 2019. O «Museu do Pensamento» recebeu o prémio de melhor livro infantojuvenil da Sociedade Portuguesa de Autores 2018 e do Prémio Literário de Fátima na mesma categoria. Recebeu diversos outros prémios: Prémio Jovens Criadores 2005; Menção Honrosa no Prémio Nacional de Literatura Juvenil Ferreira de Castro (1998); Melhor Argumento para BD (SOSracismo e editora Baleiazul, 1999); Prémio Escrevendo a Partir da Pintura (Fundação Calouste Gulbenkian, 2000); Melhor Ensaio O Movimento Olímpico (Comité Olímpico Português, 2000); Prémio Jovens Criadores – Literatura (Clube Português de Artes e Ideias, 2005); Menção Honrosa no Prémio UP-Utopia (Universidade de Letras do Porto, 2005); 1.º lugar no Concurso Literário Persona (2006). E finalmente o Prémio Maria Amália Vaz de Carvalho (CMLoures, 2009) para o seu primeiro romance «Diálogos para o Fim do Mundo» (editorial Caminho, 2010).